O sumiço dos pardais

Estava vendo um vídeo muito interessante no Youtube do ornitólogo Willian Menq falando de algo que me intriga há um bom tempo. O sumiço dos pardais nas grandes cidades.
Na minha infância, o pardal era praticamente o único pássaro que se podia ver numa cidade como São Paulo. De fato, a afinidade que esse pássaro desenvolveu com o convívio humano, fez dele um habitante comum em centenas de cidades pelo mundo todo e ficou registrada em seu nome científico, Passer domesticus. Gradualmente, no entanto, eles foram se tornando cada vez mais raros em muitos locais, ao mesmo tempo que outras espécies começaram a se tornar mais e mais comuns na paisagem urbana. Mas, por que os pardais sumiram?

O autor do vídeo argumenta que os pardais foram sumindo das cidades à medida que os edifícios começaram a substituir as casas baixas, com seus forros, onde costumeiramente os pardais preferencialmente faziam seus ninhos. Esta teoria não me convenceu o suficiente. Ainda há muitas casas e construções que os pardais poderiam muito bem utilizar, da mesma forma que as pombas, por exemplo, que também gostam de usar o forro das casas para fazer seus ninhos, estão indo muito bem e chegam a ser uma praga em muitos casos, cosmopolitas que são como os pardais. Já cheguei a ver também um casal de periquitos usando o forro de uma casa como ninho, logo, se serve para os periquitos, para os pardais também deve servir. O vídeo, porém, diz algo que me deu a peça que faltava para formular uma teoria sobre o sumiço dos pardais, ao mencionar que “o pardal nunca conseguiu conquistar as áreas rurais do Brasil”.

Para ir adiante, é preciso lembrar que o pardal não é uma ave nativa do Brasil. Ela foi introduzida artificialmente por aqui há coisa de 120 anos, inicialmente no Rio de Janeiro e depois se espalhando por todo o país. O que eu vejo é que as grandes cidades, por incrível que pareça, estão mais arborizadas do que poucas década atrás. Isso se vê comparando fotos antigas com fotos recentes dos mesmos locais. Há muito mais árvores nas ruas, parques e praças. Com isso, as espécies nativas aos poucos começaram a reocupar áreas urbanas de onde haviam sumido há muito tempo. A prova disso é que muita gente confirma ver hoje em dia muito mais sabiás, bem-te-vis, sanhaços, periquitos, canários e muitas outras aves, o que há alguns anos era bem mais raro.
As espécies nativas disputam espaço com os pardais e levam vantagem sobre eles pois estão em seu ambiente natural, são mais bem adaptadas a ele. Os pardais também são menores do que muitas aves nativas. Tudo isso fez com que os pardais fossem expulsos das cidades tão logo estas voltaram a oferecer um ambiente mais vantajoso às aves que antes já habitavam o espaço onde as cidades foram estabelecidas.

Recentemente, depois de muito tempo, vi pardais em São Paulo. Onde? Justamente no centro da cidade. Ali, onde as árvores continuam mais raras, devido ao excesso de calçadões e adensamento maior, as aves nativas ainda não retornaram como nos bairros mais afastados. Quer dizer, os prédios são amigos dos pardais! Com isso, pardais continuam à vontade por ali, onde o ambiente urbano lhes confere uma certa vantagem na disputa territorial com aves nativas.
Em outras palavras, não foram as aves nativas que voltaram com o sumiço dos pardais. Foram os pardais que sumiram com a volta das aves nativas. Faz sentido?

Hamilton Furtado

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